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quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Crescimento da arqueologia brasileira esbarra na falta de profissionais e de infraestrutura

Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – A arqueologia brasileira cresceu e apareceu em 2013. São dezenas de sítios arqueológicos descobertos pelo país e centenas de milhares de artefatos sendo recompostos e estudados. Somente no Rio de Janeiro, foram encontradas mais de 200 mil peças da época do Império, várias intactas, na antiga Estação da Leopoldina, no centro, um trecho da Estrada Real do início do século 18, no centro-sul fluminense. Milhares de objetos do século 19 estão em processo de estudo após sua descoberta no Cais do Valongo, zona portuária, local onde embarcaram mais de 1 milhão de escravos africanos e que concorre ao status de patrimônio da humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).

Se por um lado o crescimento e a valorização da prática foram bem-vindos pelos arqueólogos, o aumento vertiginoso da demanda por profissionais, por fiscalização e por locais adequados ao armazenamento das relíquias é motivo de apreensão para a categoria.
Para o responsável pela pesquisa arqueológica na Leopoldina, Cláudio Prado de Mello, a falta de investimento por parte do poder público na infraestrutura e na contratação de pessoal põem em risco a integridade de centenas de milhares de objetos que não apenas fazem parte da história do país como também podem ajudar a sociedade a entender melhor o seu passado.
“Os arqueólogos estão escavando, mas não há onde guardar [as peças]. Tem material jogado. É uma questão física, não há espaço. Os museus não têm verbas, os funcionários ganham pouco, a fiscalização e a regulamentação da prática são frouxas”, critica Prado de Mello. “Nos países de primeiro mundo, os museus investem em reformas, ampliam seus espaços. Aqui, ninguém se responsabiliza pelo material”.
O Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro (Ipharj), do qual ele faz parte, pretende credenciar-se junto ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para se responsabilizar pela guarda e estudo do material encontrado na Leopoldina. “O que é um absurdo, pois acaba transferindo o que deveria ser do Estado para as instituições privadas”.
Apesar das críticas, Prado de Mello acha que 2013 foi um ano muito positivo para a arqueologia em relação ao aumento da conscientização da população a repeito da importância de se preservar o patrimônio histórico.
“A população, de forma geral, está respeitando muito o trabalho da arqueologia. A sociedade está se mobilizando para salvar patrimônios como o Museu do Índio, por exemplo [no Rio de Janeiro]. Na Leopoldina, havia uma pressão para se destruir tudo, mas conseguimos preservar este sítio com o apoio da sociedade”, explica.
“Devido à Copa e às Olimpíadas, a cidade [Rio] está sendo escavada toda, então é muito importante que, além da sociedade, o poder público também tenha consciência da importância dos sítios e achados arqueológicos”, completou.
O arqueólogo Eduardo Neves, do Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (USP), ponderou que o desafio do setor no Brasil é equiparar a quantidade das pesquisas à qualidade dos trabalhos. “Esse crescimento é bom, mas gera uma série de problemas. Não temos um bom controle de qualidade das pesquisas que estão sendo feitas, estamos produzindo muitos acervos que estão sendo guardados em locais pouco adequados”, lamenta.

Neves considera boa a lei referente ao patrimônio arqueológico, mas lamenta que o seu cumprimento não está se convertendo de fato em produção de conhecimento de melhor qualidade. “Falta planejamento nessas grandes obras, nos levantamentos preliminares, a arqueologia chega no final do segundo tempo e não dá para fazer algo de qualidade”, completa.
A diretora do Centro Nacional de Arqueologia (CNA), Rosana Najjar, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) destaca que a meta do órgão para 2014 é justamente enfrentar o problema da falta de locais adequados de armazenamento e da falta de diagnóstico das coleções.
“Em abril receberemos 80 novos arqueólogos que nos darão fôlego para a fiscalização e, neste ano, já conseguimos estabelecer um ritmo bom com maior qualidade nas autorizações. Além disso, estamos conseguindo abrir diálogo e estreitar as relações e os entes dos licenciamentos: empreendedores, órgãos de licenciamento e pesquisadores”, diz.
Rosana ressaltou que o Iphan pretende visitar cada instituição com acervos, pelo menos uma vez, até o fim do ano que vem. “Faremos uma grande vistoria e depois um diagnóstico e um plano com regras para análise, conservação e guarda da coleção. Em seguida, daremos um prazo para que as instituições se adequem”.
O CNA é responsável pela autorização e permissão de todas as pesquisas arqueológicas no país, seu acompanhamento e fiscalização, além da implementação de ações de socialização do patrimônio arqueológico. Até a segunda semana de dezembro, segundo Rosana, houve 1.361 pesquisas autorizadas, quase o dobro do ano passado.
Cerca de 95% das pesquisas feitas são de contrato, quando há exigência de arqueólogos em obras de impacto ambiental, como rodovias e hidrelétricas. Para atender a essa demanda, o órgão tem cerca de 40 arqueólogos distribuídos entre 27 superintendências. 

Profissão de arqueólogo ainda não é regulamentada

Flávia Villela
Repórter da Agência Brasil

Rio de Janeiro – O gosto pela arqueologia começou cedo para o professor Pedro Paulo Abreu Funari. A escolha da profissão, ainda na adolescência, foi influenciada pelo livro Deuses, Túmulos e Sábios, do escritor alemão C. W. Ceram. A ausência de cursos de graduação na área, obrigou-o a cursar história, na Universidade de São Paulo (USP), no início da década de 1980, e somente na pós-graduação pôde especializar-se no que realmente gostava.
“Até o fim do século passado, a arqueologia era praticamente apenas uma pós-graduação”, disse, ao avaliar que até o ano 2000, o número de arqueólogos no Brasil tenha oscilado entre 300 e 500 profissionais “no máximo”. Hoje, pós-doutor em arqueologia e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ele avalia que “deve haver mais de 3 mil arqueólogos graduados no país”.
O arqueólogo Eduardo Neves, da Universidade de São Paulo (USP), disse que até a década de 1990 os arqueólogos no país praticamente pagavam para trabalhar. “Às vezes não havia dinheiro para ir na esquina”, brinca. “Hoje, em compensação, nunca houve tantas pessoas vivendo de arqueologia. O desafio agora é definir um bom padrão para os egressos dos cursos de graduação e garantir que as pesquisas sejam feitas realmente por arqueólogos”.
Com as leis ambientais implementadas na década de 1990, a arqueologia tornou-se um dos quesitos para o licenciamento ambiental de obras de impacto ambiental, exigindo a presença de uma equipe de arqueologia. Em 2002, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) estabeleceu critérios para a condução dessas pesquisas.
O novo contexto jurídico provocou um aumento da demanda por arqueólogos para trabalhar em obras, como rodovias, metrôs e estádios. Entretanto, a profissão não é regulamentada e, para a categoria, esse é um problema, sobretudo no momento atual, devido às grandes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) que vêm possibilitando a descoberta de toneladas de artefatos arqueológicos no Brasil.
Para a professora e pesquisadora Madu Gaspar, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a regulamentação da profissão de arqueologia evitará que pessoas despreparadas lidem com o patrimônio cultural brasileiro. “Você deixaria uma pessoa que não tem experiência restaurar o Theatro Municipal ou a Capela Sistina?”, questiona a arqueóloga.
Segundo Madu, todo arqueólogo deve ter uma perspectiva teórica, estratégicas metodológicas para produzir conhecimento sobre hábitos e costumes de um povo. Desta forma, a regulamentação permite que um profissional “incompetente” perca o direito de exercer a profissão. “Os arqueólogos não catam caquinhos, não catam pedrinhas. As pessoas não podem sair por aí pensando em metro quadrado, em coletar caquinho”, comenta.
Pesquisador do Instituto de Pesquisa Histórica e Arqueológica do Rio de Janeiro, o arqueólogo Cláudio Prado de Mello lamenta que a falta de regulamentação e de regras claras para a contratação de profissionais na área de arqueologia esteja provocando a destruição de sítios arqueológicos inteiros.
“Hoje a arqueologia está contaminada com profissionais de outras áreas sem comprometimento com a ciência. Há empresas que estão oferecendo orçamentos de projetos pela metade do preço cobrado por uma equipe de arqueólogos e acabam ganhando o trabalho, mas não fazem bem ou às vezes não fazem nada”, disse Mello.
Para a diretora do Centro Nacional de Arqueologia (CNA), do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Rosana Najjar, a regulamentação da profissão favorece critérios mais claros e evita análises subjetivas do currículo na hora da escolha do profissional para um projeto. “Os cronogramas das obras atrasam, pois os relatórios não são aprovados e os projetos acabam retornando”, diz Rosana, que considera a mobilização dos profissionais e da sociedade fundamentais para pressionar a regulamentação da profissão de arqueólogo urgentemente.
“Será bom para quem contrata, para os arqueólogos, para quem está se formando, e assim todos poderão se adaptar com regras claras. O Iphan estará sempre apoiando esse movimento”, completou.

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